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Metadados Convida2 de julho de 2025

Saúde mental no trabalho: RH como agente de mudança

Em entrevista ao Metadados Convida, psicóloga Fernanda Biacchi destaca a importância do tema nas organizações

Saúde mental no trabalho: RH como agente de mudança

A saúde mental tem ganhado espaço nas organizações. Dois marcos legais contribuíram para isso. Um foi quando o burnout passou a ser reconhecido como doença ocupacional em janeiro de 2022. Outro foi em agosto 2024, quando a NR-1 incluiu os fatores de risco psicossociais no Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR). A mensagem é clara: cuidar da saúde emocional dos colaboradores deixou de ser opcional.

Mas as empresas atentas ao assunto têm muito mais a ganhar do que simplesmente cumprir a lei. O bem-estar psicológico impacta na performance e na retenção dos profissionais. É isso que defende Fernanda Biacchi, psicóloga com formação em Gestão Estratégica de Pessoas, em entrevista ao Metadados Convida. Com experiência em projetos globais na América Latina, Estados Unidos e Europa, Fernanda atuou liderando iniciativas de desenvolvimento de times, recrutamento e performance em setores como tecnologia, mercado financeiro e startups.

Nesta entrevista, ela destaca o papel fundamental do RH como agente de mudança. Segundo a psicóloga, cabe ao setor traduzir a importância da saúde mental em números, dados e diagnósticos. Ela destaca ainda que o RH tem o papel de influenciar líderes e a cultura interna. Confira!

Metadados: Qual é a sua visão sobre o maior erro das empresas quando elas pensam em saúde mental no trabalho?

Fernanda: Hoje em dia, muito se fala de saúde mental no âmbito individual. As empresas precisam entender um pouco mais sobre o impacto da saúde mental principalmente na performance dos profissionais. Como esse tema vem ganhando espaço, a grande dificuldade é entender a importância desse tema no contexto organizacional. Não é apenas no individual, no aspecto de saúde mental de cada um, mas também no aspecto de performance, o quanto os profissionais vão conseguir entregar o que a empresa espera. Esse é um ponto bem relevante e superimportante que ainda existe uma certa dificuldade de as empresas entenderem.

Metadados: Quer dizer, quando a pessoa tem saúde mental, ela consegue entregar mais profissionalmente?

Fernanda: Exatamente. A gente já tem estudos que dizem que a produtividade realmente tem um percentual que aumenta se a saúde mental está boa. Inclusive, é um dado extremamente relevante para apresentar para as empresas ao defender essa pauta de saúde mental. Porque não é só o profissional estar ali, que a gente chama de presenteísmo. O profissional está presente, mas será que ele realmente está presente? Em termos de estar bem, ele está com a saúde mental boa para desenvolver um bom trabalho? Então, entra o fator de quanto a saúde mental impacta na performance dos profissionais.

Confira o vídeo com a entrevista completa!

Metadados: Muitas empresas fazem ações pontuais de saúde mental: tem palestras, entrega de brindes, sessões de ioga, massagem. Isso é suficiente ou é preciso buscar ações com mais efeito na saúde mental dos colaboradores?

Fernanda: Quando a gente faz algumas ações sem entender o que de fato acontece dentro das organizações, muitas vezes a gente nota que não é eficaz (fazer as ações). Daqui a pouco, vai ter algum afastamento ou baixa de performance. Por quê? Porque a gente não entendeu o contexto. Então, essas ações são preventivas. São ações necessárias também, porém, muitas vezes isso não vai resolver o problema daquela organização.

Então, é preciso fazer um diagnóstico mais aprofundado e a gente já tem ferramentas para isso. Esse é um ponto bem importante de trazer. A gente consegue medir, de fato, como está a saúde mental das equipes. Essas ações que são feitas pelas empresas, obviamente, são ações boas, mas não necessariamente vão ser eficazes. Antes a gente precisa entender o contexto. É preciso perguntar para as pessoas e existem algumas formas de fazer isso.

Metadados: Quais são essas ferramentas?

Fernanda: A gente tem alguns inventários, como chamamos dentro da psicologia organizacional, que são como diagnósticos. São testes que a gente aplica para conseguir identificar quais são os pontos em que a gente precisa agir. Então, fazemos tipo uma pesquisa de clima e a conseguimos mensurar o que está acontecendo: é questão de comunicação? É questão de excesso de trabalho? Resiliência?

Por exemplo, tem equipes que têm muita pressão por entrega e, às vezes, isso impacta na saúde mental. Então, a gente consegue medir isso através dessas ferramentas que são testes psicológicos validados e, assim, consegue ter um diagnóstico muito mais preciso.

Metadados: Isso pode ser usado lá no plano de ação do PGR, que agora também passa a ser uma exigência da NR-1?

Fernanda: Exatamente, exatamente. É uma ferramenta muito boa porque ela vai conseguir também medir, que é aquilo que o PGR fala: o que está mais crítico. Tem como medir, vamos dizer assim, por urgências para dar prioridade. Então, a gente consegue ter esse dado um pouco mais efetivo.

Guia completo: Fatores psicossociais no PGR. Acesse!

Metadados: E qual está o papel do RH para transformar o cuidado com a saúde mental do colaborador em algo contínuo dentro das organizações?

Fernanda: O RH é grande pilar da cultura e ele é um parceiro estratégico das lideranças. Então, ele precisa estar muito próximo das lideranças para que, de fato, consiga levar a saúde mental como um assunto que vai mudar. O RH vai trabalhar tem o papel fundamental de influenciar os líderes para esse assunto. É trazer dados, trazer números, porque a gente sabe que muitas vezes – eu tenho experiência com o RH também – a liderança precisa de números, precisa dos porquês. Então, o RH está ali para ser um porta-voz, para estar junto com a liderança e dizer assim: “se a gente fizer isso, olha o impacto disso para a sua equipe”. É um grande parceiro e precisa muito ter essa influência de realmente fazer com que os líderes entendam a importância desse assunto.

Metadados: A gente sabe justamente que a liderança é um grande pilar do bem-estar do colaborador. Quais práticas de gestão são importantes para que isso se mantenha?

Fernanda: Bom, o famoso one-on-one, de estar falando com os colaboradores, escutando. Muitas vezes, os líderes também precisam de suporte, de ajuda. Aí é que entra o RH, como um grande parceiro na área de Gestão de Pessoas. Então, a liderança tem alguns rituais de gestão que a aproxima das equipes.

Esse ritual de one-on-one, de acompanhamento, de escuta das equipes, de ter um momento de escuta sem estar pensando só no resultado. Ter esses momentos de descompressão, que são momentos um pouco mais leves, onde as pessoas conseguem trazer mais elementos da sua vida. Então, são algumas práticas que a gente vê que funcionam. Ter uma comunicação clara também é fundamental. A arte da escuta: um grande líder tem que ter muito dessa habilidade de poder escutar, e não só escutar com uma vontade de agir, dar um feedback... Não, é realmente acolher as pessoas.

Tem que ter essa proximidade com a equipe, e assim a gente vai conseguir trazer as pessoas para perto, elas poderem realmente trocar, e dizer: “olha, eu estou com essa dificuldade”. No ambiente organizacional, as pessoas têm muita dificuldade de trazer isso, e como é que elas vão trazer isso? Se a gente permitir esse espaço de escuta. Então, a liderança precisa ter esse espaço.

Metadados: Pela tua fala, não tem como criar um ambiente seguro psicologicamente sem um trabalho conjunto do líder, do RH, do colaborador.

Fernanda: Exatamente. Sempre digo que as organizações são orgânicas. Tudo é muito dinâmico e tudo que acontece numa organização trabalha com o emocional das pessoas. Saúde mental está ligada com esse aspecto emocional de todo mundo. É uma questão que tem que ser mensurada não só pontualmente; é algo que a gente tem que fazer constantemente. A gente tem que escutar os colaboradores e pensar em ações que são necessárias, mas sempre pensando que não é o fim. Uma organização vai mudando, vai tendo outras prioridades, outras metas, e a saúde mental junto. Então, ela não é algo é estático.

Metadados: Muitas organizações estão há tanto tempo trabalhando de uma certa maneira que até param de fazer autocrítica. Tem como saber se um comportamento é tóxico de antemão? É possível fazer esse tipo de análise agora para fazer também a mudança na sequência?

Fernanda: Tudo precisa ser medido. A gente precisa entender qual é o comportamento que está afetando, e a gente tem, como eu falei, ferramentas. Então, como gente vai medir um comportamento tóxico? A gente vai ter que questionar. E aí entra um ponto bem importante que muitas pessoas não se sentem à vontade de trazer.

Então, as empresas podem ter canais de denúncias – é que essa palavra é muito forte –, mas existem canais onde as pessoas podem trazer também esses dados de que tal comportamento está afetando o meu psicológico dentro da empresa, de uma forma anônima. Então, isso é bem importante.

Mas existem também ferramentas, testes psicológicos que a gente consegue medir isso. As pessoas não falam tanto isso, mas existem hoje vários testes que são aplicados em empresas que a gente consegue extrair muita coisa. Tem um embasamento estatístico. Conseguimos ter esses dados, e para a RH isso é muito legal. Quando a gente tem esses dados, é muito mais fácil de agir na coisa certa.

Metadados: Um primeiro passo, então, talvez seja parar de trabalhar no achismo, porque muitas vezes a gente parte do pressuposto de que saúde mental é um assunto subjetivo.

Fernanda: Exatamente. E isso vai ajudar, muitas vezes, a enxergar coisas que as pessoas não trazem, não levam para uma pesquisa de clima. Então, assim, a pesquisa de clima é fundamental, ela é ótima, mas muitas vezes a gente não consegue pegar no detalhe o que realmente a gente precisa fazer para melhorar a saúde mental das equipes. Sou uma pessoa apaixonada por teste psicológico, porque fora que tem todo um embasamento estatístico de números, a gente consegue mensurar isso e levar de uma forma estratégica.

Metadados: Daqui para a frente, no futuro, o que que tu vês como tendência ou necessidade nessa área de saúde mental?

Fernanda: Vejo só perspectivas boas para essa área, porque tem coisas que a inteligência artificial não vai entender. A inteligência artificial não vai conseguir substituir, por exemplo, a empatia, a criatividade de resolver problemas. Ela resolve algumas coisas, mas o fundamental está na interação com as pessoas, na troca, na dinâmica, na cultura organizacional. A saúde mental está super em alta e vai ser cada vez mais. Existem dados que a gente consegue mensurar, mas tudo é muito humano. As lideranças precisam estar cada vez mais próximas da equipe, ter essa sensibilidade.

A NR-1 agora, tudo que estão se falando do aspecto de saúde mental, é uma ponta do que está por vir, porque isso deu um alerta, deu um olhar diferenciado para saúde mental que antes não existia. Então eu vejo que cada vez mais as empresas vão se dar conta da importância desse tema, que impacta no físico, impacta na produtividade, impacta nas relações, impacta no afastamento, na saída dos talentos, então.

No futuro, eu vejo que vai ser uma área que todas as empresas vão precisar olhar para isso. As empresas vão se dar conta – eu acho que já estão se dando conta – que não é só saúde física, não é só o colaborador estar fisicamente trabalhando. Isso é algo que as empresas já vão conseguir ver com essas medidas, essas leis que estão chegando da NR-1, o burnout entrando como doença ocupacional. Já existem empresas que tem uma área específica só para falar de saúde mental. Então, eu vejo que no futuro vai ser uma área bem valorizada.

Metadados: Millennials já vinham falando disso, mas a geração Z traz essa preocupação ainda maior e a tendência é que as próximas também continuem esse movimento de preocupação com a saúde mental. Então vai haver uma substituição das gerações no mercado de trabalho, nas próximas décadas. Cuidar desse tema vai ser inevitável, certamente.

Fernanda: A gente já está vendo esse movimento, que as empresas muitas vezes estão perdendo profissionais talentosos ou os talentos escolhendo muito onde vão trabalhar e olhando para isso. Antes, não existia tanto isso, era assim: “ah, eu vou trabalhar e vou daqui a pouco fazer uma carreira de 30 anos e o ambiente não importa. Se eu sofrer ou se eu não sofrer eu vou estar lá”. Hoje em dia as gerações novas já dizem: “não, não quero isso pra mim”. Já estão tendo esse olhar um pouco mais criterioso e isso justamente porque começou a se falar sobre isso. As gerações cada vez mais vão olhar para os ambientes de trabalho, com certeza.

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Conheça quem escreveu o artigo

  • Flavia Noal
    Flavia Noal

    Flavia é jornalista com 15 anos de experiência em reportagem, produção de programas de rádio e assessoria de imprensa. Atualmente, é produtora de conteúdo da Metadados com atuação voltada aos diversos assuntos da área de Recursos Humanos.

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